Mestre
26 de fevereiro de 2019
Juazeiro do Norte (Região do Cariri)
24 de novembro de 1949.
Mestre Expedito nos esperava ansioso na porta de sua casa no Bairro Frei Damião em Juazeiro do Norte. Quando entramos estava o cenário todo arrumado na sua sala: instrumentos, discos, roupas, cafuringas, chapéus denotando todos os personagens que ele já vestiu e ainda incorpora na sua grande lida da vida como representante da cultura popular. Na sua fala ligeira e mente em ebulição só fala de como foram os mais de sessenta anos de brincante e apresentações . Mesmo depois da conversa o Mestre ficou nos mostrando sua memória e seu vigor em diversas músicas e declamações. Um prazer compartilhado entre mestre e plateia.
Padrinho Ciço, fundador de Juazeiro e protetor do romeiro desse imenso sertão / Padrinho Ciço, fundador de Juazeiro e protetor do romeiro desse imenso sertão / Frei Damião que era nosso capuchinho, ele está com Jesus Cristo, já cumpriu sua missão / Frei Damião que era nosso capuchinho, ele está com Jesus Cristo, já cumpriu sua missão / Eu nunca achei um mestre pra dá ni mim, se já deu já levou fim ou anda no mundo encantado /Eu nunca achei um mestre pra ni dá mim, se já deu já levou fim ou anda no mundo encantado / Tô preparado pra brincar, brinco bonito / Eu sou o Mestre Expedito e sou um mestre respeitado / tô preparado pra brincar, brinco bonito / Eu sou o Mestre Expedito e sou um mestre respeitado.
“Nós somos apenas personagens.”
Eu sou Expedito Antonio do Nascimento. Nasci no Sítio Bom Sucesso, município de Caririaçú mas me criei dentro de Juazeiro. Posso bem dizer que sou filho de Juazeiro do Norte. Só não fiz nascer dentro de Juazeiro, mas as primeiras passadas que eu dei na minha vida foi dentro dessa cidade. Morava no Sítio Barro Branco, na propriedade do Padre Orlando. E comecei a tocar em 1957 mais meu tio na banda Cabaçal Santo Expedito, que era dos meus avós e dos meus tios. Foi fundada em 22 de março de 1901 pelos irmãos Marcos de Sousa. Eu comecei tocando mais meu tio, em 56. Quando foi em 1971, ele entregou a banda cabaçal para mim.
Eu toco na banda cabaçal, brinco de Mateu há 50 anos, brincava palhaço perna de pau – não brinco mais por causa da coluna – e faço parte da Orquestra Armorial do Cariri, do Professor Francisco DiFreitas. Tem nove anos que eu ando com ele.
Agora eu estou sozinho no pife. Meus tocadores morreram. Quando eu vou fazer uma tocada com a banda cabaçal tem que tomar um tocador emprestado. É tanto, que agora eu mudei o grupo. Eu só toco com a banda cabaçal em renovaçao. Para fazer a representação nós criamos, além da orquestra armorial, o grupo Caboclo Eletrônico. Nós fomos numa competição lá no Dragão do Mar, achamos bom e que deu certo. Eram três pessoas, agora são seis: eu, no pife; DiFreitas, na rabeca; Evânio, na viola; Sidália, na rabeca; Daniel, na bateria e meu irmão no triângulo. Nós já fizemos representação no Crato, na Serra de Guaramiranga. E eu vou levando assim.
Já tem 61 anos que eu estou dentro da cultura. Vivo doente. Mas eu continuo sempre na cultura. Só deixo um dia quando eu morrer. Enquanto eu puder andar, nem que seja numa cadeira de rodas, se for possível, eu vou trabalhar na cultura, porque foi o que eu aprendi.
Nasci e me criei na roça. Nunca fui prá escola aprender nada, que meu padrasto era meio carrasco não deixava eu ir pra escola. O negócio era só na roça mesmo e tinha meu tio que tocava na banda cabaçal e eu então comecei tocando mais ele e queria brincar de Mateu, e ele me disse: você tá muito novo prá brincar de Mateu e eu vou falar com Zé Izidio prá você brincar de figura. Eu ainda brinquei cinco anos de figura no reisado do finado Zé Izídio, que era um reisado muito antigo que tinha aqui no Cariri. Eu fui brincar de figura foi em 1960. Tinha 11 anos.
Eu sempre gostei de brincar de Mateu, de palhaço. Eu sempre gostei da banda cabaçal. Foi o que eu aprendi com meus parentes. Ainda alcancei meu avô tocando pife; os irmãos dele tocavam pife também. E eu fiquei apaixonado pela banda cabaçal, pela dança, pelas as tocadas porque eu achava muito bonito: banda cabaçal, reisado, bacamarteiro.
Na banda cabaçal eu toco tudo: zabumba, caixa, pife, prato. E sou mestre artesão. Eu tenho 50 anos que faço zabumba, caixa, pife. E também atirei 25 anos de bacamarte.
É uma honra muito grande o Estado me reconhecer e me classificar Mestre da Cultura, porque eu já vinha esperando isso há muito tempo. Fazia 8 anos que DiFreitas botava os papéis para a Secult. No ano anterior ao que ganhei, foram 15 mestres e eu fiquei no número 16. Quem ganhou aqui no Juazeiro foi Pedro Bandeira de Caldas. Disseram que podia botar recurso. Eu disse não! Para uma pessoa respeitada no Brasil e no mundo que nem Pedro Bandeira, eu não vou competir. Quando for minha vez, Deus e os homens vão me classificar. Quando foi no próximo ano, eu recebi a notícia. Fiquei muito feliz porque me reconheceram.
Isso mudou a minha vida. Eu já fui cinco vezes para Sao Paulo, três vezes pra Brasilia, cinco vezes para o Rio de Janeiro. Eu tenho 41 viagens dentro de Fortaleza desde que comecei. Eu fiz o Circuito Ceará de Cultura. Andei o Ceará todo com o Dr. Raiz, com o Junior Bocão. Nós fizemos Fortaleza, Crateús, São João de Jaguaribe, Iguatu, passando ainda em Limoeiro do Norte, na época que os mestres estavam lá.
Andei muito com a orquestra armorial. Com DiFreitas eram 19 pessoas. Fomos pra São Paulo quatro vezes, fomos em Fortaleza várias vezes, fizemos o Cariri todinho. Fui em Niterói, Rio de Janeiro. Acho muito bom tocar com outros grupos. Porque a tradição do violino, da rabeca é cultura popular. O grupo dele é cultura popular. Ele bota mestre de reisado para brincar com ele. Bota Marinez, do coco. Botou Mestre Tico, um tempo. E Mestre Tico não aguentou mais. E ele trabalha com o pessoal da cultura. Uma vez ele levou oito mestres daqui para Fortaleza e nós passamos cinco dias lá, fazendo umas representações la no Teatro José de Alencar.
Acredito que a cultura não acaba nunca. Porque vão morrendo os mais velhos e vão ficando as pessoas que ensaiaram com aqueles mais velhos e continua botando para frente. Os Aniceto, do Crato, por exemplo… eram quatro irmãos. Morreram. Só tem um dos antigos. Mas tem os filhos e outras bandinhas dos netos. Porque aquilo não vai acabar. Eles estão continuando. Eu vou morrer, mas fica o meu irmão. A cultura é uma coisa maravilhosa, uma coisa muito boa. Não pode parar não.
Ser Mestre para mim… Eu não sou mestre. Eu sou apenas um personagem da cultura, que me dediquei desde de criança, de menino. Mestre é aquele (mostrando uma foto na parede de Jesus Cristo), que está lá no céu. Esse é que é o Mestre verdadeiro. Nós somos apenas personagens.
Eu tenho vontade de ensinar um pouquinho do que eu sei para os outros. Mas infelizmente as crianças daqui não se interessam muito. Só teve esse grupinho da Santa Edwirges que ensaiou comigo. Eles aprenderam, ensaiaram comigo aqui e já hoje eles têm a bandinha deles. Eu que fiz os instrumentos deles. Hoje, já estão tocando até na Festa de Santo Antonio. Tocaram dois anos, em Barbalha. Foram até na Casa Grande de Nova Olinda.
O que eu digo para eles é: a cultura é uma coisa boa. Porque eu nasci e me criei na roça. Não sei ler, não sei nada. Mas eu tenho 10 vôos de avião para fazer representação fora. Pro Rio, para São Paulo, Chile, Brasília. Quanto eu digo isso para os novatos, ele se interessam em aprender, para viajar, andar de avião, pra eu ver como é. E eles convidam outras crianças.
Vocês estão vendo esses violõesinhos e cavaquinhos aqui? (mostrando os instrumentos). É para chamar os meninos, prá aprender a tocar. Eu não sei tocar para negócio de forró, mas toco para reisado e tem um colega meu que disse que na hora que eu quiser botar uma aula de violão, que ele vem ensinar para as crianças. É por isso que eu quero aumentar a frota de violão e cavaquinho. Para ver se eu boto uma escola de música pros meninos apreender.
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