Mestra
15 de maio de 2018
Fortaleza
3 de abril de 1947
A Casa de Ogum Megê fica no bairro Bom Jardim, em Fortaleza. Chegamos lá no meio de uma manhã de trabalho. Muitas mulheres, suas filhas de Santo, organizando o espaço amplo, arejado, cheio de plantas e ícones da umbanda. O cheiro do almoço já começava a pairar no ambiente e a Mestra, reverenciada por todos, nos recebe com austera simpatia. A entrevista de Mãe Zimá foi no meio da sala de trabalho, rodeada dos Santos e Orixás que lhe guiam e dão força para acolher e curar aqueles que lhe procuram. Entre e conversa e a sessão de trabalho espiritual, um almoço coletivo onde todos os muitos convidados e trabalhadores da casa partilharam boas energias, sorrisos e uma comida deliciosa como é a prática em casa de umbanda.
Padrinho Ciço, fundador de Juazeiro e protetor do romeiro desse imenso sertão / Padrinho Ciço, fundador de Juazeiro e protetor do romeiro desse imenso sertão / Frei Damião que era nosso capuchinho, ele está com Jesus Cristo, já cumpriu sua missão / Frei Damião que era nosso capuchinho, ele está com Jesus Cristo, já cumpriu sua missão / Eu nunca achei um mestre pra dá ni mim, se já deu já levou fim ou anda no mundo encantado /Eu nunca achei um mestre pra ni dá mim, se já deu já levou fim ou anda no mundo encantado / Tô preparado pra brincar, brinco bonito / Eu sou o Mestre Expedito e sou um mestre respeitado / tô preparado pra brincar, brinco bonito / Eu sou o Mestre Expedito e sou um mestre respeitado.
“Essa é a minha missão aqui na Terra: ajudar os outros.”
Meu nome é Zimá Ferreira da Silva. Nasci no dia 3 de abril de 1947,
numa Sexta-feira Santa.
Desde os meus 7 anos eu comecei a trabalhar, na Casa do meu avô. Esse período era muito difícil porque as pessoas não aceitavam a religião. Meus pais me levaram para a igreja. Eu fiz a primeira comunhão e eu fiz todos os procedimentos na Igreja Católica. Por esses motivos é que eu sempre fui mais um pouco afastada da família. Mas depois, com o decorrer do tempo, todos começaram a compreender e entender que eu tinha essa minha parte que eu trazia de “carrego” dos meus avós.
Durante a minha vida toda eu sempre vivi dentro da umbanda. Com os meus 14 anos eu comecei a frequentar a casa do meu Pai de Santo e lá eu fiquei até o tempo que ele partiu. Com o decorrer desse tempo todo, eu sempre gostei de fazer o bem e a caridade, a cura. Fazer as minhas garrafadas, fazer meus banhos e levantar os meus filhos que batem na minha porta. Porque a coisa melhor que existe no mundo é você saber fazer as pessoas felizes. Porque quando você é feliz eu me sinto feliz também.
E até hoje eu estou aqui. Um amigo veio e me vendeu esse terreno para eu botar a casa dos meus caboclos. E aqui eu vim e aqui estou. Espero estar por muito tempo. Para ajudar a quem precisa. Pois chega muita gente doente. Aqui chegam pessoas doentes, desenganadas do médico, pessoas de fora, uma delas, é minha filha de santo. Frequenta a minha casa com as demais pessoas da família dela, que mora no Acre. Então, para mim, isso é uma vitória.
A filha de santo é aquela que a Mãe de Santo cuida dela. Com o decorrer do tempo, ela vai se desenvolvendo espiritualmente e passa a ser Mãe de Santo. Mas para ela ser Mãe de Santo, ela tem que ter todos os “cruzo” e todas as “obrigações” para se tornar uma Mãe de Santo que cuida dos outros. Porque, se eu chego na sua casa pedindo uma caridade, você, a partir daquele momento que a gente passa a mão, o santo passa a mão, o caboco passa a mão sobre a cabeça, então já faz parte da casa. E eu digo sempre: se passou do portão pra dentro, são meus filhos. Porque filhos de santo é aquele que a gente convive no dia a dia, participam no dia a dia, cuida espiritualmente. E a pessoa se torna a filha de santo, a filha da casa. Então essa que é a filha de santo. E a Mãe de Santo é só com o decorrer do tempo que vai fazendo, vai fazendo todos os procedimentos da casa e aprendendo e desenvolvendo espiritualmente, aí vai ser, vai ser a Mãe de Santo.
A Casa de Ogum Megê faz tudo. Cuida espiritualmente, cuida amorosamente, cuida na saúde e, muitas vezes, no abrimento de caminhos: pra dinheiro, pra negócios. Tudo isso a Casa de Ogum faz, sempre ajudando uns aos outros. Porque se eu ajudo um, ou outro ajuda o outro, assim sucessivamente. Aqui não tem distinção de cor nem de qualidade. Todos nós somos iguais. Tanto faz entrar pela porta a pessoa que é varredor como o desembargador. Todo mundo é igual como um ser humano. Aqui ninguém tem distinção de cor nem de qualidade. Porque como ser humano todos nós somos iguais, todos nós temos sentimentos, todos nós sentimos dores, angústias e outras coisas. Porque a Casa precisa de pessoas que sejam humildes, amigas e companheiras. Então, aqui nessa Casa de Ogum, todos nós somos assim.
O trabalho da mãe de santo é muito forte, muito árduo e muito determinado. Porque se eu entro com as mãos e os pés e a cabeça, eu entro com toda força para eu conseguir aquilo que a pessoa chega a me pedir. Quantas pessoas não choram a meus pés porque estão doentes. E os médicos disseram que lá não podiam se curar?
E aqui eu faço as garrafadas, aqui eu faço os banhos e faço a cura. E quantas pessoas que já chegaram aqui e que foram ao médico de volta e o médico perguntou: o que foi que você tomou? Eu tomei uma garrafada. Então continue…. Problema de câncer, com problema de gastrite. Com outros problemas de saúde forte, que faz a gente ter pena.
Muitas coisas têm cura. Às vezes a gente alivia a dor para a pessoa não sofrer tanto. Mas quando é determinado por Deus, todos nós vamos. Eu digo sempre aqui que a morte é o renascer de uma nova vida. A gente nasce, cresce, vive e parte para uma vida melhor. Porque o espírito para mim é tudo, nunca morre.
Às vezes chega uma criança que para eu rezar. Eu rezo a criança sai boazinha de um quebrante, de uma dor de barriga. Às vezes chegam pessoas aqui com inflamação no útero, nos ovários. Eu faço uma garrafada, duas e na terceira a pessoa está boa. Tem problema de pressão alta, eu faço um chá, uma coisa e a pessoa melhora.
Chega aqui um “louco de pedra”. Eu deito no pé do santo, dou-lhe um banho, dou um descarrego e a pessoa sai maravilhosa. Então isso para mim é muito gratificante. Essa força astral que Deus me deu para eu curar e ajudar meu próximo.
Eu acho que essa é a minha missão aqui na Terra: ajudar os outros. Como todas as pessoas que chegam aqui me ajudam. Porque um sorriso e um abraço pra mim já é uma ajuda.
Eu sou Mãe de Santo há uns 40 anos ou mais. Muitas pessoas já passaram por aqui. Eu tenho muitos filhos que passaram por aqui e que moram na Europa. Eu conheço França, Viena, Verona, Milão, Suíça, Roma, África, Portugal, Bruxelas e Cuba. Eu conheço 11 países fora do Brasil, com as minhas filhas de santo, que moram lá, que casaram e que já moram lá e meus netos também.
Eu vou para lá por conta delas. Quando elas não podem vir para cá, elas mandam me buscar e eu vou até lá. Agora tem um que viajou para os Estados Unidos. Tá em tempo de enlouquecer para eu ir aos Estados Unidos. Eu não vou, pois hoje eu já tenho medo por conta dessa situação, dessa doença que vem por aí, que ninguém sabe o que é. E ninguém sabe porque foi isso. (Covid19)
Os meus pretos velhos dizem o seguinte: que essa doença veio para ensinar a gente ser amiga, companheira e humilde. Porque tem pessoas que pisam além do ser humano, porque acham que tem dinheiro, porque é influente. Isso aqui não! Como ser humano, nós somos todos iguais. Não existe diferença entre o rico e o pobre. Como ser humano, somos todos iguais. Eu acredito que é isso.
A energia da Casa sendo boa e os pretos velhos ajudam muito. E a compreensão e a força espiritual que você tem curam. Eu posso chegar morrendo de dor, mas a minha força espiritual é tão grande e a minha fé é mais forte ainda que cura, porque a fé remove montanhas.
Infelizmente, o preconceito existe. Porque eu só acredito em um Deus, puro e verdadeiro. Em qualquer religião só existe um. E se esse Deus é de todos, não tem porquê as pessoas terem preconceito com a religião. As pessoas não passam na rua e dizem assim: lá vai a Dona Zimá. Elas dizem: lá vai a macumbeira Zimá. Isso não me deixa triste porque eu acho que eles, as pessoas que dizem isso, é porque não têm fé e não acreditam que todos nós, como ser humano, somos iguais.
Eu praticamente morava com os meus avós. Mamãe me deixava de manhã lá e ia trabalhar. A pedra onde eu recebi o meu primeiro caboco, hoje eu tenho na minha casa, a Pedra de Xangô. Eu tinha sete anos, eu não sabia o que era a vida. E eu senti muita dor de cabeça, provoquei muito e quando eu saí do quarto do meu avô e fui até onde estava essa pedra, foi lá onde eu recebi o meu orixá, meu primeiro caboco. De lá eu vim participando da mesa branca – porque o meu avô era espírita – e até aquele momento eu não entendia o que era. E meu avô começou a me ensinar o que era a vida espiritual.
Mas aí eu me afastei um pouco porque ia para a Igreja Católica. Mas não foi lá na Igreja Católica que eu me encontrei. Eu me encontrei dentro do centro espírita e dentro da casa do meu Pai de Santo, o finado José Alberto. Foi lá onde eu me encontrei espiritualmente. Foi lá onde eu me encontrei dentro da religião, e a prova é que eu estou até hoje, e com muito orgulho.
Eu me encontrar é eu ficar bem dentro da minha religião. Sentir a presença de coisas boas, sentir que você pode ajudar, você pode permanecer, você pode curar, você pode ser você mesmo. E pedir a Deus e aos bons orixás que lhe ajude a crescer e a melhorar.
Para mim, ser Mestra da Cultura é um orgulho. Por quê? Porque fui reconhecida no que eu deixei pra trás para poder seguir a minha religião. Então, por eu seguir a minha religião, eu me senti bem. Não é orgulho. É uma forma de você sentir que você foi reconhecida.
Acredito que o reconhecimento é muito importante na vida da gente. Eu acho bom como as pessoas dizem: “ lá vem à Mestra”. Às vezes até sorrio e digo obrigada. Por onde eu passo todos me chamam de mãe. “Mãe Zimá, Mãe Zimá”… Eu entro dentro do Mercado São Sebastião e todos me chamam de mãe Zimá. Eu entro dentro do supermercado… é “benção mãe, benção mãe”. Isso para mim é um orgulho, porque todo mundo me tem como mãe e eu acredito que eu seja uma boa mãe, porque se eu não fosse, ninguém me dava nem um bom dia.
E eu sou a mesma pessoa de antes. Eu acho que aqui no meu bairro ninguém sabe o que eu sou Mestra. Sabe que eu sou a Mãe Zimá. Porque não adianta você estar dizendo eu sou isso, sou aquilo.Você tem que mostrar às pessoas aquilo que você pode fazer por alguém. E na minha comunidade eu ajudo a todos. Se bater na minha porta precisando de mim, eu abro as portas e deixo entrar. Come comigo na mesa. Se estiver doente, eu levo para o médico. Se estiver precisando de alguma coisa, eu estou junto. Então, eles reconhecem o que eu faço por eles.
Tem muitos filhos de santo, comigo, tem muitos…. muitos… Eu tenho a Elenice, que está comigo aqui há mais de 20 anos. Ela tem uma mediunidade muito forte. A Gleice, que fica na ponta da minha mesa, que é minha neta de santo, filha da Elenice. Tem o Brás, tem a Bete, tem o Thiago, tem a Aline… tem muitos, muitos, muitos. E eu gostaria que quando eu partisse dessa para uma melhor eles ficassem, não fechassem a casa, ficassem tomando conta da casa. Hoje, eles acham que a mãe é quem vai trabalhar. Mas eu acho que eles é que deveriam ter mais coragem para tomar a frente e ficar dentro da casa para a casa não fechar
E toda essa moçada, meninada que entra aqui, a maioria são evangélicos. Mas eu tomo um café na casa dos evangélicos. A minha festa de Cosme e Damião, aqui tem 200, 300 crianças. Todos são evangelhos e frequentam a minha casa. Todos eles respeitam a minha religião como eu respeito a deles. E eu digo a eles que só existe um Deus, puro e verdadeiro, em toda religião e que eles podem entrar, que nada aqui que tem de mal. Isso só acontece na minha casa de umbanda
Quando as pessoas vem de fora – como já veio o Hanz e o Robert, da Áustria – elas chegam aqui, eu mostro os Santos e dou os banhos delas. E eu levo conhecimento do que eu sei até elas. Muito embora elas não entendam, mas pelo menos respeitam. Isso para mim é muito, muito gratificante.
A Casa de Santo é onde você deixa as suas mágoas, as suas dores e as suas angústias. Porque se você entrar numa igreja, você vai pedir tudo isso que eu estou dizendo: que tire de você as angústias, as dores, as maldades. Se você entra dentro de uma casa de Candomblé, você pede a mesma coisa. E se você entra em uma Casa de Umbanda, você entra com o único objetivo: de ser feliz, de se limpar, de prosperar e ter saúde. Então tudo isso existe entre o céu e a terra.
99th Keliling street, Pekanbaru
62+5200-1500-250
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