Mestre
16 de maio de 2005.
Crato (Distrito de Bela Vista) – Região do Cariri.
13 de agosto de 1953.
Mestre Cirilo nos aguardava sorridente na calçada larga de sua casa, que mais parece uma varanda. Foi ali, naquele espaço, que passamos um bom tempo numa conversa relaxada, tanto, que a tarde se prolongou até de noitinha. É curioso como ele parecia estar de bem com a vida, e nos deu uma impressão de serenidade e alegria. Nos mostrou com orgulho as publicações que se referem ao seu trabalho de mestre e que guarda com todo o cuidado, cantou algumas músicas das apresentações do maneiro-pau e ainda dançou um bocadinho. Se a gente bobeia ficaria noite a dentro com a animação do mestre.
Eu subi terra de fogo, com alpargarta de algodão. As alpargartas se queimaram eu desci com pé no chão. Desci na ponta da nuvem por um estralo de um trovão. Pisei em terra firme, com dois crucifixos na mão. De um lado São Cosme e do outro São Damião. Em prece acode o cruzeiro da virgem da Conceição.
“Nós temos que fazer esse trabalho resgatando as raízes, junto com os outros mestres. “
Meu nome é José Demétrio de Araújo. Conhecido no Brasil e no mundo como Mestre Cirilo. Essa tradição de cultura popular eu comecei com oito anos de idade, participando dos reisados que tinha lá no trecho. Eu sempre ia para os reisados e, para mim, aquilo era a coisa mais bonita da minha vida. Era a cultura popular.
Comecei com reisado. Criança, oito anos de idade. Comecei no reisado do Mestre Aldenir. Brinquei uma temporada com o Mestre Aldenir. Aí fui brincar com o Mestre Dedé de Luna, lá no Buriti. Depois fui brincar com Mestre Tico, no Juazeiro do Norte. E, durante um ano, eu participei do maneiro pau do Mestre Bigode, em Juazeiro. Trouxe Bigode pro Crato, fizemos umas apresentações…
Foi aí que o baluarte do Crato, mestre Elói Teles, que foi quem fundou a metade desses grupos, foi quem manteve a tradição, de dar fardamento, calçado – corria atrás, fazia tudo, brigava com os prefeitos pra não deixar faltar nada para a cultura popular… Ele falou prá mim: o maneiro pau do Crato tem que ser seu. Porque tem o maneiro pau do Carnaúba, mas ele está no fim da vida e vai se acabar. Forme um maneiro pau que eu dou assistência. Como de fato eu formei e, com 15 dias, Mestre Elói veio assistir um ensaio, achou muito bom e me chamou pra eu ir para o Crato, para a gente comprar o fardamento, roupa, calçado. Nós fomos, compramos e formamos esse maneiro pau que está aqui até hoje. No meu grupo nós somos 12 homens e, no pequeno, 12 meninos. O meu é só com homem. Mas existe maneiro pau com mulher pelo meio.
Pra mim ser mestre é uma honra muito grande, de você tá trabalhando com adulto e com criança, tirando menino do mal caminho, tirando das ruas, tirando da criminalidade. E a gente trata de fazer isso toda hora e todo dia com a criançada da região. A gente vai fazer esse trabalho em colégios, nas escolas, vai fazer nas praças, onde precisar. Agora, às sextas feiras, vou dar oficina a uns alunos, de uma escola no Crato, que são deficientes. Vou com muito prazer. Isso eu vou sem ganhar nada. Só porque eu tenho aquela satisfação e eles querem amar a cultura do jeito que eu amo.
Eu ter sido contemplado como mestre da cultura, recebendo esse salário… minha vida mudou bastante porque eu tenho esse salário pra manter minha tradição. Se eu passar o mês parado eu tenho como fazer a minha feira. Agradeço muito a Deus e ao Governador do Estado e a todos que fazem esse trabalho da cultura popular. Lá em Limoeiro, no Encontro do Mestres, é bom demais! O cabra vai lá e passa quatro ou cinco dias, é uma satisfação maior do mundo….de noite uma festa grande… Meniiino… aquilo é uma alegria pra nós.
A comunidade daqui me acolhe bastante. Sempre eu faço umas terreiradas pesadas aqui! E toda vida que eu faço uma terreirada aqui meu terreiro fica super lotado de gente. Eu faço um macunzá pro pessoal, um lanche e todo mundo sai satisfeito e ficam perguntando: quando é que vai ter outra? Quando nós vamos participar de outra na sua casa? E o meu grupo de crianças já se apresentou aqui no meu terreiro.
Eu acho muito importante manter a tradição. Se um dia eu não tiver mais aqui tem eles pra continuar pra frente. Eu tô repassando. Nós temos que fazer esse trabalho resgatando as raízes, junto com os outros mestres, pra continuar que nem a gente. Tradição que a gente não pode deixar morrer, não pode deixar se acabar, não!
É com muito orgulho que eu me sinto quando eu estou no meio da multidão e vou fazer minha apresentação com meu grupo. A turma toda satisfeita, tudo alegre, tudo contente e, quando a gente começa, eles começam com garra e, com mais garra, eu começo… e quando a gente termina aquela apresentação somos muito bem aplaudidos. Sempre aonde a gente chega nós nunca passamos em baixo!
Maneiro pau tem que ter repente, fazer repente, criado na hora, tipo uma embolada. Tem músicas criadas por mim e tem músicas antigas que todos os maneiros-pau cantam. Eu tiro a música e o grupo resposta. A roda resposta. Eu fico de fora, no microfone cantando e balançando o ganzá, eles respostando a música e eu fazendo o verso.
E quando eu vou parar a música, tem que fazer o apito. Eles obedecem o apito. Eles podem estar por onde tivere… espalhados. Na hora que eu açulero no apito, no dias as apresentações, por onde eles estiverem, pelo terreiro, eles correm pra, onde eu estou… quando eu açulero eles tão sabendo que eu estou chamado eles. Quem executa a turma todinha é o apito. Quando é para começar, um apito, já fica tudo em forma. Quando é para terminar, outro apito.
Aí eu canto assim: Ôh Maria Bonita / Lampião mandou chamar / ele era bom no rifle / e nós somos bom no jucá / Ôh Maria Bonita / Lampião mandou chamar / ele era bom no rifle / e nós somos bom no jucá / vocês vou repassar / eu tô de cabeça branca / eu não posso botar banca / que eu não vou negociar / Ôh Maria Bonita / Lampião mandou chamar / ele era bom no rifle / e nós somos bom no jucá.
Aí a gente vai prolongando, fazendo repente, eles respostando. É muito tempo… Uma apresentação você faz de 15 minutos, faz de 20, de uma hora, de duas horas, três horas… Quem diz é o dono da casa, de uma renovação, pra qualquer repartição que a pessoa vai fazer aquele evento. A gente pergunta como é que eles vão querer, eles perguntam também como a gente faz e daí por diante a gente começa o tirinete. É uma noite toda se quiser. A pessoa fazendo música e fazendo repente.
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